Atualmente, as renúncias fiscais representam em torno de 4,4% do PIB e 22,4% da arrecadação da União, o equivalente a cerca de R$ 440 bilhões em 2022. Ou seja, esse gasto público indireto feito pelo sistema tributário equivale a uma arrecadação anual a cada quatro anos.
A pesquisa sobre “Renúncia de receita e desigualdades: um debate negligenciado”, desenvolvido pela diretora do Instituto Justiça Fiscal (IJF) e professora dos programas de pós-graduação em Economia Profissional e em Política Social e Serviço Social da UFRGS, Rosa Chieza e pela estudante de Economia, Anne Kelly Linck, foi um dos vencedores do I Prêmio Orçamento Público, Garantia de Direitos e Combate às Desigualdades.
O objetivo do trabalho foi analisar a renúncia da União de 2004 a 2020, a aderência às normas, em especial à Lei de Responsabilidade Fiscal, os beneficiários da política e os resultados à sociedade. “Não há compensação, não é possível saber quem são os beneficiários e tampouco os resultados que os mesmos devolvem à sociedade por conta dos benefícios fiscais recebidos”, constata a pesquisadora Rosa Chieza.
“A opacidade dos dados impede o monitoramento e a avaliação dos resultados efetivos entregues pelos beneficiados”, enfatiza a docente. Segundo a professora, a política de renúncia, ao retirar recursos de direitos sociais redutores de desigualdades, conforme mostra pesquisa da Cepal (2015) e transferir para grupos de maior poder, não passíveis de efetiva mensuração de resultados, tende a ampliar desigualdades sociais no Brasil.
A renúncia de receita acontece, por exemplo, quando o governo deixa de arrecadar valores por isenções e outras concessões permitidas pela legislação. Segundo a Lei de Responsabilidade Fiscal (LRF) esse tipo de incentivo não pode afetar as metas de resultados fiscais dos governos. E, quando isso ocorrer, é preciso que haja medidas, como aumento de impostos, que compensem a renúncia dessas receitas. Na prática, não é o que acontece.
Beneficiários e resultados nebulosos
O estudo demonstra dois pesos e duas medidas quanto ao cumprimento LRF. A pesquisa apontou que a LRF vigente há 22 anos é rigorosamente cumprida no corte dos gastos sociais; porém, negligenciada quando a renúncia de receita afeta resultados fiscais. Neste caso, a lei determina que, quando a renúncia de receita afeta essas metas, deve haver compensação por elevação de alíquotas, ampliação da base de cálculo, de forma que a renúncia só vigore após implementadas compensações.
Só o orçamento da saúde perdeu R$ 43 bilhões em 2020, ano que a Covid vitimou 195 mil brasileiros. Além disso, 40% das renúncias são de tributos que financiam o orçamento da Seguridade Social (saúde, assistência e previdência). Em 2019, a renúncia com a Cofins, a Contribuição Previdência Social (CPS) e a Contribuição Social sobre o Lucro Líquido (CSLL) foi R$ 143,3 bilhões, valor superior a estimada economia anual de R$ 100 bilhões alegada pelo Governo para perfazer “R$ 1 trilhão em 10 anos” com a Reforma da Previdência.
O prêmio é promovido pela Associação Nacional dos Servidores da Carreira de Planejamento e Orçamento (Assecor) e pela Fundação Tide Setubal.