Em audiência na Câmara dos Deputados, o ministro da Saúde, Marcelo Queiroga, minimizou nesta terça-feira a atuação do filho dele, Antônio Cristovão Neto, o Queiroguinha, na intermediação da liberação de recursos. Ao longo do último mês, O GLOBO publicou uma série de reportagens que mostra como Queiroguinha tem se valido de recursos federais e de eventos públicos do governo para turbinar sua pré-campanha a deputado federal no estado da Paraíba.
Indagado por pelo menos quatro deputados, que queriam saber sobre o “acesso livre” dado a Queiroguinha em diferentes pastas, Marcelo Queiroga disse “não ver problema” em sua atuação.
— Qual é o problema de um filho visitar um pai no ambiente de trabalho? Tenho a consciência tranquila, ajo dentro da lei. Todos os recursos liberados pelo ministério da Saúde são recursos avaliados pela equipe técnica do ministério. Duvido que os técnicos coloquem seu CPF para liberar recursos de maneira imprópria. Liberação de recurso de maneira imprópria e corrupção pandêmica não são características do governo de Jair Bolsonaro — destacou.
O filho do ministro da Saúde tem participado de eventos de lançamento de obras e frequentado cerimônias, ocasiões em que fala como representante do Executivo, mesmo sem ocupar um cargo público. Nessas circunstâncias, Queiroguinha ainda promete colocar prefeitos em contato direto com o seu pai para tratar de liberação de recursos públicos.
A audiência na Câmara dos Deputados teve início às 9h. Foi uma reunião conjunta das comissões de Defesa do Consumidor, de Defesa dos Direitos da Mulher, de Fiscalização Financeira e Controle, de Seguridade Social e Família, e de Trabalho, Administração e Serviço Público.
Líder o PSB na Câmara, o deputado maranhense Bira do Pindaré foi o autor do requerimento para que o ministro comparecesse à Câmara, na data de hoje, para responder às questões do caso Queiroguinha. Por meio de um acordo de líderes, no entanto, ficou acertado que o ministro compareceria, mas também para prestar esclarecimentos relacionados a requerimentos de outras comissões.
Queiroguinha fala no ouvido do presidente Jair Bolsonaro durante evento do governo em junho — Foto: Reprodução
Na audiência, Bira do Pindaré questionou se Queiroguinha exerce algum cargo no governo e se existe um “gabinete paralelo” comandado pelo filho do ministro na sede da pasta em Brasília.
— Isso não seria tráfico de influência? Seu filho está usando a máquina pública para se eleger? Isso não seria improbidade administrativa? — perguntou o deputado.
O ministro, neste momento, se irritou e fez acusações contra os governos que antecederam a gestão de Jair Bolsonaro.
— Nós sabemos onde os líderes de governos anteriores foram parar. Nós sabemos onde estavam os recursos da Petrobras — afirmou.
Os deputados, então, começaram a pressionar o ministro, afirmando que ele estava se esquivando das perguntas e que o caso será investigado por Polícia Federal e Ministério Público Federal. Houve um princípio de bate-boca e o presidente da sessão teve que intervir, pedindo silêncio e que os ânimos se acalmassem.
— O caso Queiroguinha é um caso que não se sustenta. Meu filho é filiado a um partido político que é o Partido Liberal. Estamos numa época de pré-campanha. Igualmente os senhores têm o direito de assumir compromissos em nome da sua população — encerrou o ministro., já no fim da audiência.
Na segunda-feira, O GLOBO mostrou que Queiroguinha tem acesso exclusivo ao governo. No último ano, ele esteve ao menos 30 vezes no Palácio do Planalto e no Ministério da Saúde. Metade dessas visitas ocorreu a partir de fevereiro, quando o jovem universitário de 23 anos se filiou ao PL, partido do presidente Jair Bolsonaro, e se lançou como pré-candidato a deputado federal pela Paraíba, seu estado. Nenhum desses encontros foi registrado em agendas oficiais.
As catracas do Palácio do Planalto registraram ao menos 12 visitas de Queiroguinha, sendo que em ao menos três ocasiões o destino foi o gabinete do presidente da República, Jair Bolsonaro. No ministério comandado pelo pai, o estudante de medicina esteve 18 vezes no período de um ano. Todas essas visitas aconteceram pela entrada privativa da sede da pasta, reservada a autoridades.
Em 9 de março deste ano, Queiroguinha esteve no gabinete presidencial ao lado de Bolsonaro e do então ministro do Desenvolvimento Regional, Rogério Marinho, com os quais tirou uma foto e postou em suas redes sociais: “Tivemos a oportunidade de conversar sobre os avanços do Brasil e sobre as pautas da minha querida Paraíba. Como cidadão paraibano, faço questão de estar sempre a par do que acontece no meu país e no meu estado”.
Seis dias depois, em 15 de março, Queiroguinha esteve no Planalto novamente e informou na portaria que o seu destino seria a Assessoria Especial da Presidência. Em suas redes sociais, ele postou uma foto com Bolsonaro e escreveu: “Debatemos sobre muitos assuntos e avanços para o Brasil e para a Paraíba. Oramos juntos para que nosso dia seja de muitas graças. Vamos em frente!”.
Após O GLOBO revelar a atuação de Queiroguinha, o Ministério Público Federal (MPF) passou a apurar se há indícios de tráfico de influência e de improbidade administrativa.